A Pastora e o Limpa-chaminésPágina 1 / 5
Alguma vez viram um armário muito velho, enegrecido pela idade, todo esculpido com caules e folhas de trepadeiras?
Havia numa sala de estar um armário deste género que tinha pertencido à trisavó da família. Estava coberto, de cima a baixo, com rosas e túlipas esculpidas na madeira, rodeadas por grinaldas arredondadas; e, por entre tudo isso, apareciam umas cabecinhas de veados com as suas hastes.
Mas, no meio, havia uma figura de um homem — de um tipo bem estranho. Era bastante cómico, porque tinha pernas de bode, pequenos cornos na testa, uma barba comprida e um esgar peculiar, que mal podia chamar-se sorriso. As crianças da casa chamavam-lhe Brigadeiro-General-de-Brigada-Capitão-Sargento-Cabo-Pernas-de-Bode. O nome ficava-lhe bem, achavam elas, por ser difícil de dizer. Além disso, quem mais, vivo ou esculpido, teria alguma vez merecido tal título?
Seja como for, lá estava ele, com os olhos sempre voltados para a mesa por baixo do espelho, porque em cima da mesa estava uma linda pastorinha de loiça. Tinha uns sapatos dourados e um vestido enfeitado com uma rosa de loiça; tinha ainda um chapéu dourado e segurava um cajado de pastora. Oh, era realmente linda!
Mesmo a seu lado, estava um pequeno limpa-chaminés, também de loiça. Era todo preto, excepto a cara, que era cor-de-rosa e branca como a de uma rapariga; na verdade, estava tão limpo e bem arranjado como outra pessoa qualquer, porque era apenas um limpa-chaminés a fingir. O artista também podia ter feito dele um príncipe. E lá estava ele, com o seu escadote e o seu belo rosto, que não tinha uma única partícula de fuligem. E como o limpa-chaminés e a pastora tinham estado sempre junto um do outro, em cima da mesa, tinham ficado noivos, o que era a coisa mais natural do mundo. Estavam realmente muito bem um para o outro. Ambos eram jovens, ambos eram feitos do mesmo material, e cada um era tão frágil como o outro.
Não longe dali havia uma figura muito diferente, cerca de três vezes maior do que eles. Era um velho chinês, um mandarim, que abanava a cabeça. Também era de loiça, e dizia sempre que era avô da pastora. Não podia prová-lo, mas insistia em que era o seu protector, de maneira que o Brigadeiro-General-de-Brigada-Capitão-Sargento-Cabo-Pernas-de-Bode lhe pediu a mão dela em casamento, e ele consentiu, acenando.